Paris

Ontem regressei de Paris. O Salon du Livre foi um evento formidável (e em breve devo colocar mais detalhes aqui). Além disso, a própria cidade ultrapassa tudo o que se possa dizer sobre ela. Os golpes de beleza acontecem no meio da rua, como se fossem rajadas de vento que nos atingem, subitamente. Primeiro, foi a Place de la Concorde, com a igreja da Madeleine. Depois, nos dias seguintes, os museus, as outras igrejas. Os livros, as calçadas, a língua francesa. A culinária, as frutas, os xales. As pontes sobre o Sena e o inesquecível passeio de barco, poucas horas antes de eu voltar. Lembro aqueles versos de Lamartine e penso num retorno. Paris, sem dúvida, faz com que a gente deixe uma parte do coração por lá.
“O temps! Suspends ton vol, et vous, heures propices!
Suspendez votre cours:
Laissez-nous savourer les rapides délices
Des plus beaux de nos jours!”

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Em frente à casa de Victor Hugo, num dia de março.

Salon du Livre de Paris

Amigos,

Nos próximos dias, estarei participando do Salon du Livre de Paris, na companhia dos escritores Cristóvão Tezza, Marcelino Freire, Michel Laub, Ana Martins e Newton Moreno. Para mais detalhes, cliquem aqui – e, se estiverem pela cité formidable, nos veremos por lá!

 

Filmes, filmes, filmes

O carnaval serve como um período para se colocar as coisas em ordem: eis porque agora consegui – apesar dos estudos e pesquisas – uns minutinhos para voltar a este blog e fazer a postagem que há muito adio. Desde o começo do ano tenho visto filmes (a maioria, de boa a excelente qualidade) e queria comentar alguns deles. Assim, sem levar em conta resultados de Oscar ou equivalentes, forjo minha própria lista:

La grande bellezza – faz a gente sair do cinema planejando já a próxima ocasião de revê-lo, pelas ótimas soluções cênicas, pelo humor na composição dos personagens, pela trilha sonora e, claro, pela atuação de Toni Servillo (que, quando sorri, faz lembrar tanto Borges, com aquela espécie de inocência extremamente sábia).

Trapaça – é uma história que cansa, pelos badulaques no figurino e na composição dos atores – tudo num esforço para que o exagero pareça engraçado. Apesar disso, há momentos bons no texto. Mas não é nada que valha o reprise.

Álbum de família – assisti a este antes de ver os que citei anteriomente, mas só agora me lembrei de mencioná-lo (e isso é sintomático: talvez este Álbum mereça mesmo ser esquecido). É um filme completamente salvo pelas atuações, porque o roteiro não traz nada muito interessante: circula entre sofrimentos óbvios e mesquinhos. Há vários outros filmes que narram histórias íntimas e trágicas sem passar esta ideia de gratuidade: A professora de piano e Medos privados em lugares públicos são dois exemplos ótimos.

L’image manquante – maravilhoso documentário sobre a violência no Camboja na época de sua ditadura comunista. Este filme informa, embevece e lembra (pela perspectiva pessoal de testemunho de Rithy Panh) que conhecer profundamente um tema é condição essencial para transformá-lo em arte. Além disso, a representação das pessoas através de bonecos foi o golpe de mestre para poetizar a desgraça e descartar o sensacionalismo, que poderia surgir como uma solução fácil.

 

Caçadores de obras-primas – eu poderia dizer que este foi um filme péssimo do início ao fim, e não estaria mentindo. Entretanto, vou fazer uma ressalva aos segundos iniciais, quando o Retábulo de Ghent aparece filmado. Depois desta cena, aí, sim, nada mais vale. O tema, que teria interesse histórico e artístico, é completamente esmigalhado por uma sucessão de lugares-comuns na apresentação dos personagens, na trilha sonora e no texto paupérrimo, cheio de ímpetos moralizantes e de um heroísmo chinfrim. Se George Clooney ainda passava por um ator simpático até este ponto de sua carreira, agora que se propôs a dirigir e escrever tal desastre, não merece mais o meu respeito. Afinal, ele também desrespeitou o público: oferecer este caldo ralo de previsibilidades e achar que a plateia se contenta é o mesmo que chamá-la de imbecil.

Inside Llewyn Davis: balada de um homem comum – os irmãos Cohen continuam mestres, graças a Deus! Seu novo filme é impecável: excelentes atuações, timing ideal de cenas e humor fino, etc. Os amigos dirão que estou favorecendo meus comentários devido à presença felina na película. Vá lá, isso pode ser verdade, mas meu juízo não mudaria muito se eu tentasse ser imparcial. Llewyn Davis é uma versão masculina de Francis Ha – ou seja, um artista sem senso prático de vida, alguém que está envelhecendo mas continua com as irresponsabilidades de um adolescente. São comoventes e divertidos, os seus esforços para se adaptar ao mundo e ao mesmo tempo manter a coerência com os princípios nos quais acredita. Além disso, o filme é excelente em termos musicais – ganha-se uma boa história e também um show, numa única sessão.

Uma garrafa no mar de Gaza – ainda tentando tirar o atraso do Festival de Cinema Francês do ano passado (que não consegui acompanhar na íntegra), tive a sorte de alugar este ótimo filme ontem. Ele me fez voltar a Jerusalém – para além dos velhos temas religiosos e políticos, que existem, óbvio, subjacentes à narrativa, mas sem estrangulá-la com o já-sabido. Ao contrário, a história particulariza os dramas, de novo mostra a importância de uma visão pessoal.