A arte do desenho segue os mesmos gestos iniciais que a literatura e a fotografia: observação e captura. Talvez por isso eu sempre tenha gostado de acompanhar o trabalho de desenhistas, reparando na forma como alternam a atenção do modelo para o papel – e a magia com que transformam carne em traço, sob o mistério do estilo. Devido à minha curiosidade ou disponibilidade, não sei, o interesse algumas vezes foi mútuo, e já pelos menos seis ou sete artistas quiseram me desenhar (e nessa contabilidade não entram os episódios em que, como professora, percebi que a atenção fixa de certos alunos na verdade era estudo de fisionomia que, discretamente, ia se transformando em esboço, durante a aula. Nesses casos, por uma espécie de maldade incontrolável, eu fingia não perceber as intenções da pessoa e caprichava nos movimentos, nas gesticulações: arregalava os olhos, dava as costas, fazia de tudo para aumentar o grau de dificuldade da tarefa, até que o aluno desistisse e voltasse a prestar atenção na matéria. Funcionava.)
Quanto aos desenhistas que pediram minha permissão e tempo para a pose, claro que tiveram respostas positivas. Aprendi com meus gatos a estética da imobilidade relaxada, e não me constrange posar: afinal, eu observo enquanto sou observada; existe um diálogo nessa captura de imagem, e existe um silêncio permeado pelo som do lápis, das canetas, numa atmosfera que eu adoro integrar.
Ontem, portanto, havia esse grande motivo para que eu fosse ao Salão das Ilusões. O evento Mesa Branca não somente atrairia pessoas amigas que eu estava querendo rever há meses, como propunha sessões de desenho com a Raísa Christina, que eu já admirava desde o seu livro Mensagens enviadas enquanto você estava desconectado. Quando soube que havia a chance de ser desenhada por ela, entrei logo na fila – e o resultado é este, belíssimo, que vocês conferem abaixo. Um traço cheio de liberdade, revolta e, ao mesmo tempo, poética. Virou um dos meus retratos favoritos.
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